Ao meu doce público

terça-feira, 27 de abril de 2010 - Postado por Luiza Drumond às 16:11

Escrevo aqui para lhes contares como tudo começou.
Hoje neste dia com ar de tristeza e piedade lhes peço para que nunca repasse esta história, e seja lá por quais diabos você se achar nela, esqueça, é bobagem, não vale à pena persistir nela.

Sempre soube que amar a si própria era bobagem, prefiro dar amor ao invés de guardá-lo somente para mim. Não chame isto de egoísmo, chame de segurança, talvez?
Porque pensar assim? Eu não sei se vai dar certo ou não...
Chamo-me Charlotte Coy, tenho meus 13 anos, desde meu nascimento muitas coisas boas aconteceu, meu nascimento foi uma delas... Minha querida mãe sempre me disse que eu era uma pessoa difícil, que nunca soube aceitar o mundo. Que sempre tive aquele nariz empinado, aqueles olhos fundos, e uma opinião formada, que nada no mundo me iria fazer mudá-la. –Na manhã de 1898 do dia 27 de março foi quando tudo começou... Um dia chuvoso e cinzento. Eu morava numa pequena cidade dos Estados Unidos, Panama City Beach, longe das praias, das pessoas, de tudo! –Como normalmente, levantei às 08h30min, tomei o café matinal e segui para escola. Lá estudava aquelas crianças nojentas, felizes demais ao meu gosto. Julgavam-me como a rabugenta, mesquinha e mal-humorada, de pouco me importava, nunca fui de esconder quem realmente eu era, pois bem, sou assim. –Eu também nunca fui de agüentar as coisas calada, meu sangue realmente não era de barata. Nesta manhã de 27 de março, logo depois da aula de geometria veio uma garota falar comigo:
-Boa manhã, não? – Dizia ela mexendo nas mãos.
-É. Talvez. – A garota continuou falando, ela usava uma fita colorida em seus cabelos, tinha bochechas bem rosadas e um riso ridiculamente irritante. Ao meu ponto de vista, ela era mais uma daquelas crianças cheias de mimos e tudo mais. Era mais uma irritante qualquer.
Sempre soube que um coração quebrado não pode ser desperdiçado, sempre soube também que faz bem arrancar algo bom dali, ou até mesmo, sofrer em silêncio. Eu sempre fui assim, coração quebrado, nunca me importei falar sobre isso, aprendi muitas coisas sendo assim, aprendi a ser perversa. – Guardar cortes dentro de mim é o de menos, sofro com o sentimento de perda e saudade.

Perda dos pais

Eu era bem pequenina, devia ter quatro ou cinco anos quando me aconteceu à perda dos meus pais, eu lembro exatamente do meu sentimento, horrivelmente ruim, doloroso e assustador. Arrancaram uma parte de mim, foi como arrancar o coração de uma pessoa. – Foi difícil no começo, mais com o passar do tempo, tudo melhorou e vi que eu não era importante para os meus pais, era quase uma incógnita.


28 de março

Hoje tínhamos aula de redação, por um lado eu gostava, por outro não. O tema de hoje era “Profissões dos Pais.” Eu não sabia exatamente o que escrever, minha mãe cuidava de mim e da casa, meu pai trabalhava numa fazenda adestrando animais. Eu poderia contar que minha avó era aposentava e não gosta de mim? Ou contaria que tinha perdido os meus pais e acabar logo com essa dúvida?
Pois bem, eu contei, falei também o que eles eram e qual era a minha relação com eles, contei de tudo um pouco.

“Oi, meu nome é Charlotte Coy e tenho 13 anos. Estudo aqui desde quando perdi meus pais, pois faz um bom tempo. No começo foi difícil me acostumar com essa idéia e é bem mais difícil escrever sobre isso, não quero que sintam pena de mim, pra quê? Não faço falta...”

Enquanto eu contava minha história ouvia alguns risos baixos, alguns comentários e percebia alguns olhares também. Não havia nada errado contar isso, certo? Era a tarefa, então a fiz como pedido.
Eu parei na quarta linha e me sentei, a professora foi até mim e me perguntou se queria continuar, disse a ela que não. – Alguns outros alunos se ofereceram para contar, sempre tinham um final feliz, talvez os risos, comentários e olhares fossem por eles estarem acostumados com contos de fada, será? Eu era praticamente o patinho feio da classe, a mal encaixada na escola, na classe, na vida, no mundo.
Eu não me importava em contar sobre isso, mais de alguma forma eu me incomodei dessa vez, percebi que eu era caso de debocha, percebi também que naquela vez que a garota da risada irritante foi trocar meia dúzia de palavras comigo era apenas mais um caso de aposta, se eu falasse normalmente com ela ganharia um pirulito e se eu a digerisse não ganharia nada, óbvio, crianças tolas. – Duas horas se passaram desde então, todos nós fomos para o intervalo, me sentei no lugar de costume, longe de todo mundo, debaixo de uma árvore. Eu gostava de lá, era um bom lugar pra pensar, eu me sentia bem.
Eu ouvia pessoas me gritando, rindo, comentando, mais nada tirava minha concentração do tal lugar, era um momento meu com esse lugar. – A menina voltara a me perturbar, desta vez a menina foi bem clara:
-Eu sinto muito, não sei o que seria de mim se meus pais não existissem. Você não tem sorte- Em seguida deu um riso baixinho que eu pude ouvir claramente. Eu rapidamente senti uma raiva, rancor, ódio dentro mim e a chamei para brincar, antes de irmos, peguei um estilete em minha mochila. Lá fomos nós para o escorregador, nos sentamos lá.
- De que você gosta? – Dizia ela olhando para o chão.
- De pouco. – Eu disse. Em seguida peguei a mão direita dela e disse:
- Eu até gosto de você. É a única que fala comigo, não me importa que seja por aposta.
- Não é por aposta... – Tentou terminar.
- Sh, deixe-me mostra uma coisa que sei fazer. – Ela me observou, então fiz o prometido.
Olhei para ela, dei um sorriso falso-torto, finquei o estilete em sua mão e a joguei dali mesmo, não muito alto, só era o escorregador mais alto e proibido para crianças da nossa idade, era distante de tudo e todos, mais não o suficiente para ninguém ver, um garoto que contara a história por último correu e contou tudo que eu tinha feito para nossa professora de literatura. Fui levada para direção, ligaram para minha avó e ela respondeu:
– É normal, minha Senhora, ela tem esse comportamento violento desde a morte dos seus pais, façam o que quiser. – Já sabia para onde eu iria, detenção? Clinica de Reabilitação para menores? Pois bem, foi à segunda opção, buscaram minhas coisas e me levaram para lá no mesmo dia... Não durei mais que dois dias lá, eu estava um estado normal, perfeito, então me matei e deixei um bilhete:


28 de março de 1898, Panama City Beach,

Fiquem com meu coração, talvez ele seja a melhor parte de mim, mesmo com cortes, ódio e saudade. É a melhor parte de mim, toque ele e veja como eu era e como eu me sentia, foi um prazer viver com vocês.
Com todo carinho,
Charlotte.
28 de março.